domingo, 21 de abril de 2024

múltiplas poéticas



Bento Gonçalves 
é uma cidade vazia 
sem o Congresso Brasileiro

 de        Poesia


bashô 
aqui um torquato
re-encarnou
todo viagem de volta
transpoema
que o vento não levou

 

Artur Gomes 

https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/



Geleia é um personagem misterioso meio dionisíaco que vivia nos porões do Studio 52 lá pelos idos de 1987, nem sei quando onde como nasceu, vivia aprontando com o seu projeto de psicanálise popular com um divã em cada esquina. Na primeira festa das Bacantes nos altos da adega 52 devorou a sua santíssima trindade e dela hoje só resta Rúbia Querubim, que despachou Federika Lispector para os corais do Recife nas marés de Pernambuco. Vez em quando Geleia passeia pela Igreja Universal do Reino de Zeus para tirar um sarro com Pastor de Andrade quando  Missa Pagã coloca os dedos na  hóstia na língua das ovelhinhas para a encenação do ciúme nos olhos da Sacristia. Geleia não é sagado nem tem segredo as suas juras secretas decreta estado de poesia.

 

Gigi Mocidade


Basta


Santa Cruz de La Sierra 

Porto Viejo Cavajarro

o barro acende os olhos

no alpendre da casa amarelada

vejo os pés descalços de Simon Bolivar

como um tempo de promessas e esperas


trem de ferro espreita

na estação noturna

com seus olhos grandes


há distâncias entre as flores

que colhia no pomar de ossos

nos quintais da Cacomanga


e o palanque montado para a farsa

nos currais desses comícios de agora

lá nas Minas de Juiz de Fora

a pátria que te pariu não é a minha

esse teu circo é de péssima qualidade


sequestro

bolinha de papel

facada

sem qualquer veracidade


quando a morte é de verdade –

Marielle – presente !

a in-justiça não desvenda o crime

não esclarece o fato


a pátria que te pariu – lava as mãos

nem sente – o Estado se omite

porque é cúmplice no real assassinato


o ridículo cabe bem num palco italiano

na praça na rua a sol aberto

cena mal feita é descoberta

até por cego que não vê


mas sente o cheiro da tramoia

muito bem engendrada com as fardas

e as bostas – e os servis da paranoia

aliada as pressas pra montar o circo


o bobo da corte  é servido  de bandeja

se  finge de assassino – de primeira

desfere o golpe – mortal?

Não.

só de brincadeira!  –


no brazyl da mais valia

em nome de Deus vale tudo

tradição família propriedade

mas para o pobre vale nada

nem dó nem piedade

a balança da justiça é obscura

mas suas regras são bem claras


e a rainha louca – ri na nossa cara!

 

Rúbia Querubim 


  Bem no fundo

 

No fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto

 

a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuo

 

extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais

 

mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos
saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas.

 

Paulo Leminski



Boi Pintadinho

Artur Gomes/Paulo Ciranda

 

... E

lá vai o boi

com seus olhos tristes

feito mãe cansada

da estrada e da vida,

vai carregando dor nos olhos,

cabisbaixo

com medo de levantá-los

e ser o primeiro

a enfrentar a faca

ou quem sabe,

a forca.

 

Lá vai o boi de arado

boi de carro

boi de carga

boi de cerca

boi de canga

boi de corda

boi de prado

boi de corte.

Boi preto

boi branco

lá vai o boi pintadinho...

lá vai o boi

na tua consciência

triste e solitária

olhando os que passam

com medo de levantar a voz

e colocar o seu mugido

na consciência dos outros.

 

Lá vai o boi

no teu passo manso,

dança na contra-dança

com certeza que a esperança

é muito mais do que aquilo

que já te foi predestinado.

 

Lá vai o boi-pintadinho...

lá vai o boi...

boi Antônio

boi Joana

boi Maria

boi João.

Boi Thiago

Boi Ferreira

Boi Drummond

e Boi Bandeira,

e tantos outros bois

que conheci por este país afora...

que sabendo ou não sabendo

cada boi tem sua hora.

 

Lá vai o boi

com teu jeito manso

no equilíbrio manco

que me inspira e desespera...

vai para o cofre,

ele sabe disso.

Vai para o açougue

ele sabe disso.

Vai pra balança

e nem parece equilibrista

mas já conhece o seu destino.

 

Lá vai o boi –pintadinho...

E lá vai o boi

atravessando as ferrovias

nos vagões de ferro.

 

Vai carregado

de marcas pelo corpo

e agonia até a alma.

 

Levanta meu boi levanta

que é hora de viajar

acorda boi povo todo

povo e boi tem que lutar...

 

Levanta meu boi operário

boi do martírio e do salário

boi da enxada e do horário

boi da cangalha no pescoço

boi de carne, boi de osso

servindo o prato da serpente

boi da lama

boi do fosso

boi indgesto e indigente.

 

levanta meu boi de fardo

boi de cerca

boi de carga

boi de canga

boi de corda

boi de força

boi de farça

boi de farra

boi de forra

boi de festa

boi de ferro

levanta meu boi de sina

boi de pavio

espantalho

boi de pano

levanta meu boi de palha

boi de circo

boi de sonho

boi selvagem

boi de plano

levanta meu boi de barra

boi de birra

boi de barro

boi de berro.

 

Levanta meu boi pintado

homem palhaço mascarado

máscara de animal e desengano

mas homem nenhum desalmado

se mostrará com a nossa face

se cobrirá com os nossos panos

 

Levanta meu boi de prata

boi de prato

boi de pranto

boi de prego

boi de arame farpado

boi de carga e de arado

boi joão desempregado

de terno inferno e gravata

boi sem livro

boi sem ata

boi de safra

boi de cofre

boi de carta

boi de corte:

boi de carne ferida

mugindo de sul a norte,

boi que nasce pra vida

e a gente engorda prá morte.

 

Artur Gomes

http://www.youtube.com/watch?v=vGuGyQ9gR8A

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