de Poesia
bashô
aqui um torquato
re-encarnou
todo viagem de volta
transpoema
que o vento não levou
Artur Gomes
https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/
Geleia é um personagem misterioso meio dionisíaco que vivia nos porões do Studio 52 lá pelos idos de 1987, nem sei quando onde como nasceu, vivia aprontando com o seu projeto de psicanálise popular com um divã em cada esquina. Na primeira festa das Bacantes nos altos da adega 52 devorou a sua santíssima trindade e dela hoje só resta Rúbia Querubim, que despachou Federika Lispector para os corais do Recife nas marés de Pernambuco. Vez em quando Geleia passeia pela Igreja Universal do Reino de Zeus para tirar um sarro com Pastor de Andrade quando Missa Pagã coloca os dedos na hóstia na língua das ovelhinhas para a encenação do ciúme nos olhos da Sacristia. Geleia não é sagado nem tem segredo as suas juras secretas decreta estado de poesia.
Gigi Mocidade
Basta
Santa Cruz de La Sierra
Porto Viejo Cavajarro
o barro acende os olhos
no alpendre da casa amarelada
vejo os pés descalços de Simon Bolivar
como um tempo de promessas e esperas
trem de ferro espreita
na estação noturna
com seus olhos grandes
há distâncias entre as flores
que colhia no pomar de ossos
nos quintais da Cacomanga
e o palanque montado para a farsa
nos currais desses comícios de agora
lá nas Minas de Juiz de Fora
a pátria que te pariu não é a minha
esse teu circo é de péssima qualidade
sequestro
bolinha de papel
facada
sem qualquer veracidade
quando a morte é de verdade –
Marielle – presente !
a in-justiça não desvenda o crime
não esclarece o fato
a pátria que te pariu – lava as mãos
nem sente – o Estado se omite
porque é cúmplice no real assassinato
o ridículo cabe bem num palco italiano
na praça na rua a sol aberto
cena mal feita é descoberta
até por cego que não vê
mas sente o cheiro da tramoia
muito bem engendrada com as fardas
e as bostas – e os servis da paranoia
aliada as pressas pra montar o circo
o bobo da corte é
servido de bandeja
se finge de assassino –
de primeira
desfere o golpe – mortal?
Não.
só de brincadeira! –
no brazyl da mais valia
em nome de Deus vale tudo
tradição família propriedade
mas para o pobre vale nada
nem dó nem piedade
a balança da justiça é obscura
mas suas regras são bem claras
e a rainha louca – ri na nossa cara!
Rúbia
Querubim
Bem no fundo
No fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto
a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuo
extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais
mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos
saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas.
Paulo Leminski
Boi Pintadinho
Artur Gomes/Paulo Ciranda
... E
lá vai o boi
com seus olhos tristes
feito mãe cansada
da estrada e da vida,
vai carregando dor nos olhos,
cabisbaixo
com medo de levantá-los
e ser o primeiro
a enfrentar a faca
ou quem sabe,
a forca.
Lá vai o boi de arado
boi de carro
boi de carga
boi de cerca
boi de canga
boi de corda
boi de prado
boi de corte.
Boi preto
boi branco
lá vai o boi pintadinho...
lá vai o boi
na tua consciência
triste e solitária
olhando os que passam
com medo de levantar a voz
e colocar o seu mugido
na consciência dos outros.
Lá vai o boi
no teu passo manso,
dança na contra-dança
com certeza que a esperança
é muito mais do que aquilo
que já te foi predestinado.
Lá vai o boi-pintadinho...
lá vai o boi...
boi Antônio
boi Joana
boi Maria
boi João.
Boi Thiago
Boi Ferreira
Boi Drummond
e Boi Bandeira,
e tantos outros bois
que conheci por este país afora...
que sabendo ou não sabendo
cada boi tem sua hora.
Lá vai o boi
com teu jeito manso
no equilíbrio manco
que me inspira e desespera...
vai para o cofre,
ele sabe disso.
Vai para o açougue
ele sabe disso.
Vai pra balança
e nem parece equilibrista
mas já conhece o seu destino.
Lá vai o boi –pintadinho...
E lá vai o boi
atravessando as ferrovias
nos vagões de ferro.
Vai carregado
de marcas pelo corpo
e agonia até a alma.
Levanta meu boi levanta
que é hora de viajar
acorda boi povo todo
povo e boi tem que lutar...
Levanta meu boi operário
boi do martírio e do salário
boi da enxada e do horário
boi da cangalha no pescoço
boi de carne, boi de osso
servindo o prato da serpente
boi da lama
boi do fosso
boi indgesto e indigente.
levanta meu boi de fardo
boi de cerca
boi de carga
boi de canga
boi de corda
boi de força
boi de farça
boi de farra
boi de forra
boi de festa
boi de ferro
levanta meu boi de sina
boi de pavio
espantalho
boi de pano
levanta meu boi de palha
boi de circo
boi de sonho
boi selvagem
boi de plano
levanta meu boi de barra
boi de birra
boi de barro
boi de berro.
Levanta meu boi pintado
homem palhaço mascarado
máscara de animal e desengano
mas homem nenhum desalmado
se mostrará com a nossa face
se cobrirá com os nossos panos
Levanta meu boi de prata
boi de prato
boi de pranto
boi de prego
boi de arame farpado
boi de carga e de arado
boi joão desempregado
de terno inferno e gravata
boi sem livro
boi sem ata
boi de safra
boi de cofre
boi de carta
boi de corte:
boi de carne ferida
mugindo de sul a norte,
boi que nasce pra vida
e a gente engorda prá morte.
Artur Gomes
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