domingo, 21 de abril de 2024

múltiplas poéticas


As Luas de Miró

 

desde os  tempos de Moacy Cirne

com seu Balaio Vermelho

que o Cordel é um Rio de Trovão

com o seu fogo encantado

quando me olho no espelho

vejo Chico Doido de Caicó

com seus dois Zóio grandão

na Feira de São Cristóvão

rasgando o verbo sem dó

fazendo do povão seu amante

tecendo a poesia nas rendas

em oferendas para as luas de Miró

 

Bracutaia Silva

https://arturkabrunco.blogspot.com/


As Vitrines

Chico Buarque

 

Eu te vejo sumir por aí

Te avisei que a cidade era um vão

- Dá tua mão

- Olha pra mim

- Não faz assim

- Não vai lá não

 

Os letreiros a te colorir

Embaraçam a minha visão

Eu te vi suspirar de aflição

E sair da sessão, frouxa de rir

 

Já te vejo brincando, gostando de ser

Tua sombra a se multiplicar

Nos teus olhos também posso ver

As vitrines te vendo passar

 

Na galeria, cada clarão

É como um dia depois de outro dia

Abrindo um salão

Passas em exposição

Passas sem ver teu vigia

Catando a poesia

Que entornas no chão

 

https://www.youtube.com/watch?v=jrVABzDK6MM



Atentado poético

 

a hipocrisia aqui é muita
liberdade muito pouca

com meus dentes

língua/navalha
vou rasgar a tua roupa

para esse poema bomba
explodir na tua boca


o

obscuro objeto do desejo

 

de pedra dourada ficaram portas
janelas de entradas e saídas
a sedução de dois olhos
em minha carne proibida
nem tanto pelo o que falo
nem tanto pelo que sinto
a vodka a cereja o conhac
o abismo  o labirinto

 

de pedra dourada
ficou um café orgânico
no teu sertão encantada
numa manhã de domingo
do outro lado da trilha
com tanta veraCidade
que me esqueci da idade
e me apaixonei por tua filha

 

de pedra dourada ficaram
olhos acesos do outro lado a janela
o espelho as contas de vidro
o jogo da sedução a maravilha
os passeios nas cachoeiras
os banhos de bar o carnaval
aquela delícia louca
o batom na minha língua
o cheiro das flores do mal
meu bem-me-quer a tua boca

 

bandeira nacional

 

com palavras
sons
imagens
versos
inauguro o monumento
no planalto central

 

araçá azul
domingo no parque
vapor barato
mal secreto

pérola negra
construção
cabeça Gothan City
poema concreto

 

arte poesia teatro cinema pós poema

terra em transe tropicália grande sertão
veredas vidas secas
memórias do cárcere

 

parangolés
hélio oiticica
artur bispo do rosário
bacurau

seja herói seja marginal



 

                       Beatriz a Faustino

 

pudesse eu divagar pelos teus poros
bosque do teu reino entre teus pelos
mergulhar contigo o mar da fonte
atravessar da carne a pele a ponte
penetrar no orgasmo dos teus selos

 

pudesse eu cavalgar por tuas crinas
no dorso cavalar onde deflora
deixando assim então de ser menina
e me tornar mulher por toda sina
no inferno céu da tua hora

 

tragédia infame

 

empresto minha voz aos deserdados os desnutridos

os que não tem pela manhã café com pão

e sobre a mesa no almoço nem mesa

nem carne seca com farinha

 espinha de peixe na garganta

é o que sobrou pra curuminha

                         *

 empresto meu corpo minha voz

a esses personagens

os que tem sede  os que tem  fome

ou os que morrem assassinados

nos guetos  nos campos nas cidades

por balas de fuzil  está fudido o brasil

entregue as traças então me resta

exterminar o nome o sobrenome o apelido

do causador dessa desgraça

 

Artur Gomes

O Poeta Enquanto Coisa

Editora Penalux - 2020 

leia mais no blog

https://arturgumes.blogspot.com/



Avianca

 

quem voa ama
trepo na tua anca 
me leva pra tua cama.

 

Avianca

quem ama voa
embarco nas tuas asas
e me chama de Pessoa.

 

Federico Baudelaire

https://arturkabrunco.blogspot.com/


Aviso aos náufragos

 

Esta página, por exemplo,
não nasceu para ser lida.

Nasceu para ser pálida,
um mero plágio da Ilíada,
alguma coisa que cala,
folha que volta pro galho,
muito depois de caída.

 

Nasceu para ser praia,
quem sabe Andrômeda, Antártida
Himalaia, sílaba sentida,
nasceu para ser última
a que não nasceu ainda.

 

Palavras trazidas de longe
pelas águas do Nilo,
um dia, esta página, papiro,
vai ter que ser traduzida,
para o símbolo, para o sânscrito,
para todos os dialetos da Índia,
vai ter que dizer bom-dia
ao que só se diz ao pé do ouvido,
vai ter que ser a brusca pedra
onde alguém deixou cair o vidro.

 

Não e assim que é a vida?

 

Paulo Leminski

 

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