domingo, 21 de abril de 2024

múltiplas poéticas


hipótese de abril

[sil guimarães]

 

exatamente por que é dezembro

chove não chove esquenta esfria

não tem fim este mês apócrifo

como aquela tardinha errada

que fingia ser de uma sexta-feira

e era — sem dúvida — de segunda

não tem fim este espelho onde

mais uma ruga nos sobre/assalta

aos poucos somos o contrário de nós

enquanto os dias teimam & voltam

não tem fim esta espera pela festa

o bolo os balões os vivas os votos

tudo eclesiasticamente enfadonho 


                            antropofágico

 

por traz dessa palavra

tem desejo

Dandara sempre me dizia

quando interpretava Adele

a personagem erótica

dos Retalhos Imortais do SerAfim

com os nervos comendo a própria pele

e não era Jura Secreta

era cena do Além da Mesa Posta

um banquete antropofágico

         nesse país de bosta

 

Artur Gomes

https://fulinaimargem.blogspot.com/


A caminho do poente vou desconstruindo bezerros de ouro

 

A caminho do poente

deixo largos sorrisos na moldura,

uma árvore plantada em março de 72,

cadernos de caligrafia, medalhas de bronze,

o emblema da primeira escola,

minhas calças de tergal,

e todas as migrações

do desejo...

A caminho do poente

deixo pedaços de espelhos quebrados,

um gol perdido no segundo tempo da partida,

cartões postais, o apito da fábrica,

a vela da primeira comunhão,

minha boina vermelha,

e todos os translados

da paixão...

A caminho do poente

deixo um prego fincado na parede branca,

viagens de trem para um subúrbio de Caxias,

a boemia dos versos, a vida dura na capital,

a lembrança do primeiro porre,

minhas sandálias franciscanas,

e todas as vicissitudes

do amor...

A caminho do poente

vou derretendo os desejos,

as paixões e os amores embrutecidos,

enquanto miro nas nuvens à minha esquerda

as cores raras de um fim de tarde,

e o sol que encobre

tudo...

A caminho do poente

vou desarmando as ilusões,

desconstruindo os bezerros de ouro,

despindo as esperanças,

desfazendo os sonhos,

as utopias...

A caminho do poente

vou me desintegrando,

vou me despedindo,

vou me deixando...

 

Joilson Bessa.

Alphaville, últimos dias de abril de 2022.

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