Fé no Evoé:
Confissões dionisíacas na poética e política de Artur Gomes
Igor Fagundes *
Depois das excitadas e excitantes Juras Secretas, de
2018, o poeta e artista multimídia Artur Gomes volta a tornar pública
sua jura de amor e fidelidade ao arcaico deus Dionísio em O poeta enquanto
coisa, de 2020, incorporando as ébrias forças de Baco sob novos goles e
ritos, tão poéticos quanto políticos, numa contemporaneidade que avança em lama
e vertigem e, assim, exige a potência do mítico da palavra corpórea e
originária.
Comparece ao ethos
deste livro a mesma embriaguez fulinaímica de sempre: a que toma, mediante o
delírio atento frente aos passos obtusos do ser e estar das gentes, cada
palavra como taça, vinho tinto e uma tinta capaz de, em contrapartida, rogar
lúcida a passagem dilacerada do humano pelas páginas turvas do mundo.
Que, em prefácio, ressoe agora-aqui a face mesma de
assonâncias de Artur. Que em pré-faces (a da melopeia, a da fanopeia, a
da logopeia) o poeta se apresente, por assim dizer, multifacetado,
contaminando-nos com os tempos de seu ritmo venéreo. Que se capte, enfim, o
próprio escape das imagens ímpares e afiadas pelo gume de Gomes,
repetindo-se – com outros nomes e aliterações – seus deleitosos jogos de
palavras em nossa fome de análise e anúncio: incorporemos, nessa prosa de
abertura, a música de seus trocadilhos, a curvatura das paranomásias no
retilíneo das linhas do livro: a que verte vulva em verso, Afrodite em
afro-ditos de orixás em orgias com Ártemis e Hermes.
Que o veraz poeta, para aquém do denominado moderno, para além
do já clichê pós-moderno, para quem dos rótulos e taxonomias previstas pelas
literárias teorias, atravessa o pós-pós de tudo e mesmo o pó da historiografia.
Artur Gomes se exibe, ao revés, pré-antigo
(tão dentro quanto fora do chronos) na atualidade incorrigível de uma poesia
dedicada à Gaia (lê-se na dedicatória: “e a Terra/Mãe/Terra a musa eterna
dos meus estados de surtos dos meus estados de sítio dos meus estados de cio”).
Enquanto bebe, no tempo cronológico (“tempo de bestas”, “na
caretice dos bostas”), as lutas e lutos de sua época e século (“esse
país que atravesso corpo devassado em grito na cara do silêncio”),
inebria-os e subverte-os no tempo imemorial da Terra para fundar o Aion sem
fundo do instante-em-transe da experiência artística.
Por isso, não basta citar, em cacoete analítico, os tiques
nervosos que convêm à crítica (mencionar modernismos influentes, a geração
beat, a poesia pop, a tropicália...) para entender sua lírica. Nem seria
preciso. Soaria até repetitivo elencar, neste preâmbulo, as personagens caras a
Gomes, forjando-o efeito do esbarro nelas todas, do encontro com elas,
das tramas e transas com obras e corpos do passado e presente: o poeta já o faz
e cumpre a coletânea como a dramaturgia de sua errância pelo imaginário e pelo
inconsciente, os quais derramam sobre o copo do real e da consciência
alter-egos confessos e inventados – tudo o que for líquido nos vasos sanguíneos
do poeta alcooliza o poemário com o híbrido de fogo fátuo e frios fatos.
Artur Gomes – assinatura por vir,
heteronímica, heteromórfica – assim apresenta em O poeta enquanto coisa
suas juras não mais secretas, mas públicas, ainda púbicas, aos afetos que
compõem e decompõem sua literaturavida. Seus versos são rascunhos, rasuras e
ranhuras a passar a limpo os nexos e os nervos de sua fatura formal e
estilística, deixando sobre a página tanto um rastro de unha quanto o esmalte
dos escritos e vozes que em sua alma avultam e nos dedos instauram cutículas.
Tais intertextos e intratextos, ou ainda, tais hipertextos
insaciáveis se disseminam pela obra na mesma proporção com que se concentram em
cada poema, lado a lado ou embaralhados; falseando nos rebentos líricos as
certidões de batismo e, em poligamia, proliferando as certidões de casamento
com as leituras/releituras de livros, bem como com o folhear de rostos amigos,
ou com o riso e risco do desconhecido, não obstante o postergar de comprovantes
de residência, de pátrias de origem: cada gesto, um tanto Ulisses, desmente
Ítacas, deslinda labirintos (do Minotauro?) ou mesmo fios (de Ariadne?),
teatralizando ad infinitum as alteridades que servem como impressão digital
provisória e polimórfica para alguma identidade fluida, fragmentada, ao rés da
fantasia.
Mas nada disso seria possível – nenhuma conversa com livros,
nenhum sexo com as líricas de um outro e de uma outra – seria concreto sem a
lascívia uma vez mais dionisíaca de um cérebro em gozo sináptico, em
psiké-análise, em psiké-catálise, em psiké-catábase: esta que põe no divã do
poeta as divas Oxum e Afrodite atravessadas, fosse a sala do analista também um
templo pagão ou uma ilha de Lesbos, de modo que Artur construa entre sua
cama e seu karma de vate uma Igreja imoral/amoral do Reino de Zeus. E
dos muitos Eus que exilam hóstias e comungam com o jamais fixo e intransigente
credo.
Esta, a sacralização do profano e do erótico, ou a profanação
do sagrado enquanto humano, do poeta enquanto coisa (“o amor mesmo quando
profano / tem muito mais de sagrado”): filho de um deus com uma mortal,
Dionísio dança na recorrência da palavra “vinho” no livro, a exemplo dos
versos: “aqui / a poesia pulsa / na veia / no vinho”; “por vinho
tinto e poesia”; “ela tem sede de vinho / nas madrugadas dos bares”; “o vinho
do tempo na boca”; “em nossas bocas tinto – vinho”; “beijo tua
boca ainda suja / do vinho que sobrou”; “me consagro teu amante / pelos
vinhedos de Baco / no ápice sagrado / da su-real pornofonia”.
A embriaguez dos significantes e dos significados é a que
tanto forja imagens insólitas (como a de um “céu de estanho” ou
como em “ela mastiga meus ponteiros”) quanto a que costura
melodias bem trabalhadas entre vogais, consoantes ( “entre paredes pedras
facas de dois gumes / nos parreirais depois da lua), ratificando a
inteligência verbal (a logopeia) de Artur Gomes dobrada em melopeia
(música) e fanopeia (imagética).
Visualidade provocada, a saber, não só pelas imagens
significadas pelos significantes, mas visualidade ou imagem do próprio
significante, o qual, dentro de si, dá à luz significâncias outras (“EuGênio
Andrade”, “Afro-dite, “BolivariAndo”, “eletriCidade”), pois Artur Gomes
– nesta “pornofonia” – é mestre na criação de neologismos (em tudo se vê
uma “carNavalha”).
Não apenas o corpo do homem, da mulher, se sensualiza e se
sexualiza sob a força cósmica de Eros. É o poema mesmo que, em O poeta
enquanto coisa, é corpo sensualizado, sexualizado, da mesma maneira que a
cidade, o mundo, os tempos e o Tempo são Eros, vez que a palavra é pele e poro
(duas palavras aliterantes e frequentes em Artur Gomes). Nessa
porosidade, o poeta se entende permeável a coisas e pessoas (a pessoas já
misturadas às coisas, a pessoas já coisas): “por entre poros entre pelos /
minhas unhas tuas costas”. Também por isso, por essa poesia de tamanho
contato, fricção, a relação com a língua se confirma erotizada e – vale dizer –
tanto a língua física quanto a verbal, o que equivale a dizer que escrita e
oralidade se reencontram no poeta: a sofisticação da escritura literária não
perde (pelo contrário, potencializa) a dimensão primigênia do poeta como
cantor, como ator “na divina língua de Baco”, a qual se exalta mediante
a recorrência também da palavra “boca” e da palavra “coxa”: uma é
a que beija, lambe, morde e degusta; outra é a beijada, a lambida, a mordida, a
degustada.
Ambas em rima toante também entoam ritmos e ritos
profanos-sagrados:
o poema fala do teu corpo
como se o tocasse
o reconhecesse em cada verso
cada palavra que sai da boca
como um canto bíblico
com louvor profano
Nessa performance e performatividade lingual-linguística, todo
signo cisma um erotismo entre o significante e o significado, sim, mas também
entre página e palco, palco e praça, praça e povo, a babel dos povos e a babel
das palavras: daí, tantos trocadilhos (troca-trocas, orgias, surubas...), como
o da “flór do lótus” com a “flor do lácio”, o das “coxas” com
as “costas”, o do “fauno” com a “flauta”, o da “alvorada”
com o “alvoroço”, o da “antítese” com a “Antígona”.
Eis a língua física, outrossim, a trocar com a verbal, mas
sendo ao mesmo temo pelo verbal trocado, e vice-versa. Eis o poeta trocando com
outros poetas ou sendo trocado por poetas outros, vestindo a roupa dos outros e
tirando a sua roupa para ser outro: Federico Baudelaire, Gigi Mocidade,
Bracutaia Silva, Federika Bezerra, Cristina Bezerra etc.
O poeta, analista translógico da psique, troca com sua
psicanalista. E o poeta se tenta analista de si mesmo, elevando o caos para a
troca de seu nome Artur por timbres e assinaturas novos. Do mesmo modo,
o nome dos poetas que existem, os que morreram e ainda não, os vivos hoje e
sempre, vai se trocando, em rearranjos da memória (e do recriativo
esquecimento).
Artur Gomes troca poetas em seu corpo e,
trocando com eles, entende que todos trocam entre si, a exemplo do diálogo
poético de Clarice com Baudelaire. Mais ainda: o corpo do poeta troca com o
corpo do poema e, consoante em “Poética”, a metalinguagem elabora um
troca-troca de textos sob o mesmo título, pois o poema “Poética” se
metamorfoseia em outros poemas: o tema “Poética” permanece, mas se
trocando: o mesmo sendo diferente. A palavra “outro(s)” se sugere,
enfim, ouro neste livro, e é nessa não indiferença ao outro, que o poético se
faz ético e político. E nessa política da e pela diferença, a cidade do corpo
se troca e vira o corpo da cidade. Assim, o poeta é – quando e enquanto coisa.
No meio de tantas referências e reverências, borrões (d)e
assinaturas (como as de Mário de Andrade, Drummond, Torquato Neto, Rimbaud,
Mallarmé, Tanussi Cardoso, Tchello d’Barros, Jiddu Saldanha, Ronaldo Werneck,
Reinaldo Valinho Alvarez, Reinaldo Jardim, deuses e deusas gregas, orixás), o “anjo
torto” de Artur Gomes não sopra no livro Manoel de Barros ou
James Joyce, escritores também engenhosos e que se vale de muitos ilogismos ou
neologismos.
Todavia, O poeta enquanto coisa não deixa, na qualidade
de título de livro, de repercutir o Retrato do artista quando coisa
(de Barros) e o Retrato do artista quando jovem (de Joyce). Do mesmo
modo, não havendo menção (ao menos, explícita e intencional), ao “Teatro
Oficina” de José Celso Martinez Corrêa, a dimensão orgiástica da
arte e a reunião – não menos sacro-promíscua – de mitos gregos e africanos, a
assimilação pela cultura ocidental de outras culturas, aparece em Artur
Gomes nesta, quiçá, Poesia Oficina. A relação gozosa e experimental com que
a palavra se faz poema e se teatraliza faz de seus livros um grande laboratório
da língua, do corpo e da cultura, com repercussões nitidamente políticas.
Se Pantanal é o corpo poético e o poema experimental, de
aparente falta de lógica, lembrando o discurso infantil, no Manoel de Barros
do Retrato do artista quando coisa, a urbe é o corpo prenhe de
sexualidade e sensualidade em Artur Gomes, nos supostos ilogismos do
discurso adulto que se vê fragmentado e devorado por Eros e Thanatos, e no qual
a relação sujeito-objeto já não dá conta quando o humano se vê coisa (não mais
agente ou paciente, voz ativa ou passiva: talvez, as duas ao mesmo tempo).
Como no Pantanal de
Barros, a linguagem de Gomes é lamacenta, cheia de líquidos e
delírios: a seiva se expande e se intensifica com (ou se troca por) suor e
sêmen. Lama, agora, é a cama: o mangue ou o pantaneiro é a cama de Artur onde
dormem, acordam, sonham, gozam e ardem todos os corpos (humanos e não humanos)
aqui já citados e dispostos nos lençóis, colchas e fronhas da página.
Por outro lado, temos na trajetória literária de James
Joyce, a intertextualidade com Ulisses de Homero. Artur Gomes ouve o
canto da sereia em sua cama, livro, divã, e talvez do inconsciente escute a voz
de um “artista quando jovem”, vinda de Joyce. Nesta, a personagem
protagonista Stephen Dedalus, aquele que será adiante o anti-herói de Ulysses,
diz à sua mãe que não poderá seguir a vocação de padre. Ele descobriu uma nova
e grandiosa missão em sua vida: a de criar uma nova e poderosa mitologia para o
povo irlandês. O romance autobiográfico de Joyce narra a infância de Dedalus
(máscara de Joyce), personagem que vai aparecer novamente em
Ulysses. A vida do pequeno Dedalus é marcada pela religiosidade da mãe.
Ela quer que o filho siga a carreira eclesiástica. Vários padres fazem parte da
vida de Dedalus e vão moldando sua consciência. O momento de virada na
vida da personagem principal se dá no momento em que ele escuta um horrível
sermão feito por um padre sobre o inferno que o deixa muito impressionado. Dedalus
passa a viver como um carola seguindo à risca todos os jejuns e mandamentos
da igreja católica. Nesse momento, ele até se sente como um futuro padre. Com a
sequência do romance, vemos o jovem Dedalus passar de uma fase religiosa
para uma de sensualidade. Sente-se cada vez mais obcecado com a ideia da
confissão. Ele então confessa a um padre todos os pecados sensuais que pratica.
Abandona definitivamente a convocação de ser padre e passa a se interessar por
ideias artísticas e estéticas. Dedalus abandona a carreira de padre mas
não a fé.
Assim, Artur Gomes se obstina pela ideia de confissão,
mas de uma confissão dionisíaca. Primeiro, fazendo suas Juras Secretas,
suas confidências sensuais, sexuais, eróticas, fulinaímicas. Em suma, suas sagaranagens
(há algo de Joyce em Guimarães Rosa, ou vice-versa; no Rosa que há em Artur
Gomes, no sagarana dos três). Agora, em O poeta enquanto coisa,
arriscando-se a abandonar todo credo político-religioso paralisante, move-se –
avesso ao dogmático – no sentido de dançar o mitopoético, o dionisíaco. Daí,
uma Igreja Universal do Reino Zeus faça todo sentido na cosmogonia e
teogonia de Artur Gomes. Em primeiro lugar, como deboche diante de
quaisquer fundamentalismos. Em segundo lugar, como denúncia do que um Reino
de Deus pode roubar do político o vigor do poético, preferindo um louvor a
Dionísio a um Deus que não sabe dançar, que não sabe gozar, na liturgia de uma
poesia que roga
por um poema que
desconcerte
entorte desconforte arrombe a porta
dos céus da tua boca
arranhe os dentes da loba
arrebanhe os cordeiros no pasto
e lhes ensine a subverter
as ordens do pastor
assumo o risco não sou demo
nem corisco eu sou
cantor
Iansã é quem me lava
Oxossi é quem me leva
Ogum é quem me manda
Oxum é quem me guarda
eu sou o que invoca o
que provoca
e incorpora desconcentra
desconforta
desconstrói e
desconcerta
eu sou o que interpreta representa
o que inventa e desafora
o Anjo Torto graças a
Zeus
a pedra e ao Machado de Xangô
a Capitã do Mato Caipora
me xinga de poeta enganador
mal sabe ela que eu sou
da reza
que o homem que se preza
nunca se escraviza com
chicote de feitor
*Igor Fagundes é poeta, ensaísta, doutor em Poética e
professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Autor, dentre outros, de
pensamento dança (2018) e Poética na incorporação (2016). Macumbança (2020)
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terra de santa cruz
I
ao batizarem-te
deram-te o nome:
posto que a tua profissão
é abrir-te em camas
dar-te em ferro
ouro
prata
rios
peixes
minas
mata
deixar que os abutres
devorem-te na carne
o derradeiro verme
Artur Gomes
poema dos livros Couro Cru & Carne Viva - 1987
e Pátria A(r)mada - 2022
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CarNAvalha Gumes
Escrito nos anos de 1990 este poema hoje no Brasil é atualíssimo visto esse atual congresso da desordem democrática que o país em hoje. O que será que fizemos nos verões passados para chegarmos a essa situação?
neste país de fogo & palavra
se falta lenha na fornalha
uma mordaz língua não falha
cospe grosso na panela
da imperial tropicanalha
não me metam nesses planos
verdes/amarelos
meus dentes vãos a(r)mados
nem foices nem martelos
meus dentes encarnados
alvos brancos belos
já estão desenganados
desta sopa de farelos
Artur Gomes
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Balbúrdia PoÉtica 10
Dia 12 de julho
Das 14 às 19h
Casa da Palavra – Santo André-SP
Blog atualizado com poemas de Julio Mendonça e Simone Bacelar
Jura secreta 34
por que te amo
e amor não tem pele
nome ou sobrenome
não adianta chamar
que ele não vem quando se quer
porque tem seus próprios códigos
e segredos
mas não tenha medo
pode sangrar pode doer
e ferir fundo
mas é razão de estar no mundo
nem que seja por segundo
por um beijo mesmo breve
por que te amo
no sol no sal no mar na neve
Artur Gomes
poema do livro Juras Secretas
Litteralux – 2018
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https://fulinaimatupiniquim.blogspot.com/
Lidiane Carvalho Barreto na Balbúrdia PoÉtica 9 falando o poema Itabapoana Pedra Pássaro Poema de Artur Gomes
12ª Bienal do Livro de Campos dos Goytacazes-RJ
tabapoana Pedra Pássaro Poema
uma metáfora
não é apenas uma metáfora
quando a pedra é pássaro
em gargaú
às 5 horas da tarde
as garças voam
em direção
ao outro lado da pedra
em guaxindiba
tenho em mim
que pássaros voam
peixes nadam
quando procuram
outro pouso
bracutaia eterna lenda
estranho pássaro
da pedra ouviu o grito
que voou de gargaú pro infinito
Artur Gomes
poema do livro Itabapoana Pedra Pássaro Poema
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https://fulinaimagens.blogspot.com/
choveu pedra em São Francisco do Itabapoana se de gelo ou granizo inda nem sei só depois da apuração da comissão de inquérito instaurada por alguns moradores da localidade do Macuco saberei.
Federico Baudelaire
cada qual com sua Natureza , pode ser garoa ou correnteza , é o tempo comandando a sua Fortaleza
Zhô Bertholini
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O poeta enquanto coisa
o meu lugar não é aqui
o meu lugar não é ali
o meu lugar é lá
onde garrincha entorta
os laterais esquerdos
dibla até o goleiro
e debaixo da trave
não faz o gol
um desacerto
volta ao meio do campo
para re-começar o desconcerto
Artur Gomes
https://fulinaimamultiprojetos.blogspot.com/
*
um brinde a balbúrdia
nesta cidade de palha
minha balbúrdia poética
não falha
corta palavra morta
na nervura dessa pedra
na carnadura desse osso
corte grosso de navalha
pra descascar esse caroço
Artur Gomes
Balbúrdia PoÉtica
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Balbúrdia PoÉtica 7
Balburdiar : Eis O Verbo
Dia 23 – maio – 19:30h
Santa Paciência – Casa Criativa
Rua Barão de Miracema, 81 – Campos dos Goytacazes-RJ
Performance Teatro.Poesia
com Artur Gomes + Estefany Nogueira + Jonas Menezes + Paulo Victor Santanna
Lançamento do livro
Itabapoana Pedra Pássaro Poema
Roda de Conversa
com Artur Gomes + Tetê Peixoto + Fernando Rossi
Poesia Ali Na Mesa
com a poesia de
Adão Ventura + Ademir Assunção + Angel Cabeça + Armando Liguori Junior + Aroldo Pereira + Artur Gomes + Belchior + Caetano Veloso + Celso de Alencar + César Augusto de Carvalho + Clara Baccarin + Dalila Teles Veras + EuGênio Mallarmè + Federika Lispector + Federico Baudelaire + Ferreira Gullar + Gigi Mocidade + Irina Sefarina + Jorge Ventura + José Facury Heluy + Jidduks + Jurema Barreto + Karlos Chapul + Lau Siqueira + Lira Auxiliadora Lima de Castro + Luis Turiba + Mário Faustino + Mário Quintana + Martinho Santafé + Marcelo Atahulpa + Mônica Braga + Nicolas Behr + Noélia Ribeiro + Oswald de Andrade + Paulo Leminski + Pastor de Andrade + Ricardo Vieira Lima + Rosana Chrispim + Rúbia Querubim + Sady Bianhcin + Sebastião Nunes + Sérgio de Castro Pinto + Simone Bacelar + Silvana Guimarães + Tanussi Cardoso +Torquato Neto + Wélcio de Toledo + Yara Fers + Zhô Bertholini + Vivane Mosé
*
Fulinaíma MultiProjetos
22 99815-1268 - whatsapp
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Balbúrdia PoÉtica 7
Poesia Ali Na Mesa
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Campos dos Goytacazes-RJ
balburdiar eis o verbo
ver pra crer
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difícil de falar
ótimo de fazer
amor
balbúrdia gozosa
jorrando poesia
enquanto goza
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fazer balbúrdia
jogo de cartas
sem baralho
:
dá prazer
mas dá trabalho
Artur Gomes
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Itabapoana Pedra Pássaro Poema
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Balbúrdia PoÉtica 7
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*
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*
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Zhô Bertholini
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Grande Hotel Gaspar
as andorinhas de Campos
cantam desesperadas
na madrugada quase
amanhecer
como estivem
engaioladas
cantam para não
enlouquecer
como se fossem cigarras
cantam até morrer.
Roda Viva
Cidade veraCidade
uma cidade sem memória não é uma cidade como bem disse
federico Baudelaire despedaçando as pétalas do
bem ou do mal-me-quer mas se uma cidade tem nome de Santo um fato
histórico ou se tem nome de mulher procure saber quem é para que depois não
viva por aí jogado nos becos como objeto qualquer porque quem não tem
conhecimento aceita tudo do jeito que vier.
Balbúrdia PoÉtica 6
Artur Gomes e José Facury
Dois Perdidos Em Seus Poemas Sujos
Dia 17 de maio – 20h
lançamento do livro: Itabapoana Pedra |Pássaro Poema
poetas convidados: Jiddu Saldanha e Tanussi Cardoso
Roda de Samba com : Clarêncio Rodrigues e Digo Conceição
Poesia Ali Na Mesa
traição grega
helena me deu
um cavalo de pau
me jogou no vento
me pegou em troia
me roubou a jóia
me deixou em trento
Artur Gomes
Poema do livro Itabapoana Pedra Pássaro Poema
Realização: Usina4 – Fábrica de Cultura, Kino3 – Congresso Brasileiro
de Poesia – Fulinaíma MultiProjetos
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Depois
das excitadas e excitantes Juras secretas,
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mítico da palavra corpórea e originária. Comparece ao ethos deste livro a
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sempre: a que toma, mediante o delírio atento frente aos passos obtusos do ser
e estar das gentes, cada palavra como taça, vinho tinto e uma tinta capaz de,
em contrapartida, rogar lúcida a passagem dilacerada do humano pelas páginas
turvas do mundo. Que, em prefácio, ressoe agora-aqui a face mesma de
assonâncias de Artur. Que em pré-faces (a da melopeia, a da fanopeia, a da logopeia) o poeta se apresente, por
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venéreo. Que se capte, enfim, o próprio escape das imagens ímpares e afiadas
pelo gume de Gomes, repetindo-se – com outros nomes e aliterações
– seus deleitosos jogos de palavras em nossa fome de análise e anúncio:
incorporemos, nessa prosa de abertura, a música de seus trocadilhos, a
curvatura das paranomásias no retilíneo das linhas do livro: a que verte
vulva em verso, Afrodite em afro-ditos de orixás em orgias com Ártemis e
Hermes.
Que o veraz poeta, para aquém do
denominado moderno, para além do já clichê pós-moderno, para quem dos rótulos e
taxonomias previstas pelas literárias teorias, atravessa o pós-pós de tudo e mesmo o pó da
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quanto fora do chronos) na
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surtos dos meus estados de sítio dos meus estados de cio”). Enquanto bebe, no tempo cronológico (“tempo de
bestas”, “na caretice dos bostas”), as lutas e lutos de sua época e
século (“esse país que atravesso corpo devassado em grito na cara do
silêncio”), inebria-os e subverte-os no tempo imemorial da Terra para
fundar o Aion sem fundo do instante-em-transe da
experiência artística. Por isso, não basta citar, em cacoete analítico, os
tiques nervosos que convêm à crítica (mencionar modernismos influentes, a
geração beat, a poesia pop, a tropicália...) para entender
sua lírica. Nem seria preciso. Soaria até repetitivo elencar, neste preâmbulo,
as personagens caras a Gomes, forjando-o efeito do esbarro nelas todas, do
encontro com elas, das tramas e transas com obras e corpos do passado e
presente: o poeta já o faz e cumpre a coletânea como a dramaturgia de sua
errância pelo imaginário e pelo inconsciente, os quais derramam sobre o copo do
real e da consciência alter-egos confessos e inventados – tudo o que for
líquido nos vasos sanguíneos do poeta alcooliza o poemário com o híbrido
de fogo fátuo e frios fatos.
Artur Gomes – assinatura por vir, heteronímica, heteromórfica – assim apresenta em O poeta enquanto coisa suas juras não mais secretas, mas públicas, ainda púbicas, aos afetos que compõem e decompõem sua literaturavida. Seus versos são rascunhos, rasuras e ranhuras a passar a limpo os nexos e os nervos de sua fatura formal e estilística, deixando sobre a página tanto um rastro de unha quanto o esmalte dos escritos e vozes que em sua alma avultam e nos dedos instauram cutículas.
Tais intertextos e intratextos, ou ainda, tais hipertextos insaciáveis se disseminam pela obra na mesma proporção com que se concentram em cada poema, lado a lado ou embaralhados; falseando nos rebentos líricos as certidões de batismo e, em poligamia, proliferando as certidões de casamento com as leituras/releituras de livros, bem como com o folhear de rostos amigos, ou com o riso e risco do desconhecido, não obstante o postergar de comprovantes de residência, de pátrias de origem: cada gesto, um tanto Ulisses, desmente Ítacas, deslinda labirintos (do Minotauro?) ou mesmo fios (de Ariadne?), teatralizando ad infinitum as alteridades que servem como impressão digital provisória e polimórfica para alguma identidade fluida, fragmentada, ao rés da fantasia. Mas nada disso seria possível – nenhuma conversa com livros, nenhum sexo com as líricas de um outro e de uma outra – seria concreto sem a lascívia uma vez mais dionisíaca de um cérebro em gozo sináptico, em psiké-análise, em psiké-catálise, em psiké-catábase: esta que põe no divã do poeta as divas Oxum e Afrodite atravessadas, fosse a sala do analista também um templo pagão ou uma ilha de Lesbos, de modo que Artur construa entre sua cama e seu karma de vate uma Igreja imoral/amoral do Reino de Zeus. E dos muitos Eus que exilam hóstias e comungam com o jamais fixo e intransigente credo.
Esta, a sacralização do profano e do erótico, ou a profanação do sagrado enquanto humano, do poeta enquanto coisa (“o amor mesmo quando profano / tem muito mais de sagrado”): filho de um deus com uma mortal, Dionísio dança na recorrência da palavra “vinho” no livro, a exemplo dos versos: “aqui / a poesia pulsa / na veia / no vinho”; “por vinho tinto e poesia”; “ela tem sede de vinho / nas madrugadas dos bares”; “o vinho do tempo na boca”; “em nossas bocas tinto – vinho”; “beijo tua boca ainda suja / do vinho que sobrou”; “me consagro teu amante / pelos vinhedos de Baco / no ápice sagrado / da su-real pornofonia”. A embriaguez dos significantes e dos significados é a que tanto forja imagens insólitas (como a de um “céu de estanho” ou como em “ela mastiga meus ponteiros”) quanto a que costura melodias bem trabalhadas entre vogais, consoantes ( “entre paredes pedras facas de dois gumes / nos parreirais depois da lua), ratificando a inteligência verbal (a logopeia) de Artur Gomes dobrada em melopeia (música) e fanopeia (imagética). Visualidade provocada, a saber, não só pelas imagens significadas pelos significantes, mas visualidade ou imagem do próprio significante, o qual, dentro de si, dá à luz significâncias outras (“EuGênio Andrade”, “Afro-dite, “BolivariAndo”, “eletriCidade”), pois Artur Gomes – nesta “pornofonia” – é mestre na criação de neologismos (em tudo se vê uma “carNavalha”).
Não apenas o corpo do homem, da mulher, se sensualiza e se sexualiza sob a força cósmica de Eros. É o poema mesmo que, em O poeta enquanto coisa, é corpo sensualizado, sexualizado, da mesma maneira que a cidade, o mundo, os tempos e o Tempo são Eros, vez que a palavra é pele e poro (duas palavras aliterantes e frequentes em Artur Gomes). Nessa porosidade, o poeta se entende permeável a coisas e pessoas (a pessoas já misturadas às coisas, a pessoas já coisas): “por entre poros entre pelos / minhas unhas tuas costas”. Também por isso, por essa poesia de tamanho contato, fricção, a relação com a língua se confirma erotizada e – vale dizer – tanto a língua física quanto a verbal, o que equivale a dizer que escrita e oralidade se reencontram no poeta: a sofisticação da escritura literária não perde (pelo contrário, potencializa) a dimensão primigênia do poeta como cantor, como ator “na divina língua de Baco”, a qual se exalta mediante a recorrência também da palavra “boca” e da palavra “coxa”: uma é a que beija, lambe, morde e degusta; outra é a beijada, a lambida, a mordida, a degustada. Ambas em rima toante também entoam ritmos e ritos profanos-sagrados:
o
poema fala do teu corpo
como se o tocasse
o reconhecesse em cada verso
cada palavra que sai da boca
como um canto bíblico
com louvor profano
Nessa performance e performatividade lingual-linguística, todo signo cisma um erotismo entre o significante e o significado, sim, mas também entre página e palco, palco e praça, praça e povo, a babel dos povos e a babel das palavras: daí, tantos trocadilhos (troca-trocas, orgias, surubas...), como o da “flór do lótus” com a “flor do lácio”, o das “coxas” com as “costas”, o do “fauno” com a “flauta”, o da “alvorada” com o “alvoroço”, o da “antítese” com a “Antígona”. Eis a língua física, outrossim, a trocar com a verbal, mas sendo ao mesmo temo pelo verbal trocado, e vice-versa. Eis o poeta trocando com outros poetas ou sendo trocado por poetas outros, vestindo a roupa dos outros e tirando a sua roupa para ser outro: Federico Baudelaire, Gigi Mocidade, Bracutaia Silva, Federika Bezerra, Cristina Bezerra etc. O poeta, analista translógico da psique, troca com sua psicanalista. E o poeta se tenta analista de si mesmo, elevando o caos para a troca de seu nome Artur por timbres e assinaturas novos. Do mesmo modo, o nome dos poetas que existem, os que morreram e ainda não, os vivos hoje e sempre, vai se trocando, em rearranjos da memória (e do recriativo esquecimento). Artur Gomes troca poetas em seu corpo e, trocando com eles, entende que todos trocam entre si, a exemplo do diálogo poético de Clarice com Baudelaire. Mais ainda: o corpo do poeta troca com o corpo do poema e, consoante em “Poética”, a metalinguagem elabora um troca-troca de textos sob o mesmo título, pois o poema “Poética” se metamorfoseia em outros poemas: o tema “Poética” permanece, mas se trocando: o mesmo sendo diferente. A palavra “outro(s)” se sugere, enfim, ouro neste livro, e é nessa não indiferença ao outro, que o poético se faz ético e político. E nessa política da e pela diferença, a cidade do corpo se troca e vira o corpo da cidade. Assim, o poeta é – quando e enquanto coisa.
No meio de tantas referências e reverências, borrões (d)e assinaturas (como as de Mário de Andrade, Drummond, Torquato Neto, Rimbaud, Mallarmé, Tanussi Cardoso, Tchello d’Barros, Jiddu Saldanha, Ronaldo Werneck, Reinaldo Valinho Alvarez, Reinaldo Jardim, deuses e deusas gregas, orixás), o “anjo torto” de Artur Gomes não sopra no livro Manoel de Barros ou James Joyce, escritores também engenhosos e que se vale de muitos ilogismos ou neologismos. Todavia, O poeta enquanto coisa não deixa, na qualidade de título de livro, de repercutir o Retrato do artista quando coisa (de Barros) e o Retrato do artista quando jovem (de Joyce). Do mesmo modo, não havendo menção (ao menos, explícita e intencional), ao “Teatro Oficina” de José Celso Martinez Corrêa, a dimensão orgiástica da arte e a reunião – não menos sacro-promíscua – de mitos gregos e africanos, a assimilação pela cultura ocidental de outras culturas, aparece em Artur Gomes nesta, quiçá, Poesia Oficina. A relação gozosa e experimental com que a palavra se faz poema e se teatraliza faz de seus livros um grande laboratório da língua, do corpo e da cultura, com repercussões nitidamente políticas.
Se
Pantanal é o corpo poético e o poema experimental, de aparente falta de lógica,
lembrando o discurso infantil, no Manoel de Barros do Retrato do artista quando coisa, a urbe é o corpo prenhe de
sexualidade e sensualidade em Artur Gomes, nos supostos ilogismos do
discurso adulto que se vê fragmentado e devorado por Eros e Thanatos, e no qual a relação sujeito-objeto já
não dá conta quando o humano se vê coisa
(não mais agente ou paciente, voz ativa ou passiva: talvez, as duas ao mesmo
tempo). Como no Pantanal de Barros, a linguagem de Gomes é lamacenta,
cheia de líquidos e delírios: a seiva se expande e se intensifica com (ou se troca por) suor e sêmen. Lama, agora,
é a cama: o mangue ou o pantaneiro é a cama de Artur onde dormem,
acordam, sonham, gozam e ardem todos os corpos (humanos e não humanos) aqui já
citados e dispostos nos lençóis, colchas e fronhas da página.
Por outro lado, temos na trajetória literária de James Joyce, a intertextualidade com Ulisses de Homero. Artur Gomes ouve o canto da sereia em sua cama, livro, divã, e talvez do inconsciente escute a voz de um “artista quando jovem”, vinda de Joyce. Nesta, a personagem protagonista Stephen Dedalus, aquele que será adiante o anti-herói de Ulysses, diz à sua mãe que não poderá seguir a vocação de padre. Ele descobriu uma nova e grandiosa missão em sua vida: a de criar uma nova e poderosa mitologia para o povo irlandês. O romance autobiográfico de Joyce narra a infância de Dedalus (máscara de Joyce), personagem que vai aparecer novamente em Ulysses. A vida do pequeno Dedalus é marcada pela religiosidade da mãe. Ela quer que o filho siga a carreira eclesiástica. Vários padres fazem parte da vida de Dedalus e vão moldando sua consciência. O momento de virada na vida da personagem principal se dá no momento em que ele escuta um horrível sermão feito por um padre sobre o inferno que o deixa muito impressionado. Dedalus passa a viver como um carola seguindo à risca todos os jejuns e mandamentos da igreja católica. Nesse momento, ele até se sente como um futuro padre. Com a sequência do romance, vemos o jovem Dedalus passar de uma fase religiosa para uma de sensualidade. Sente-se cada vez mais obcecado com a ideia da confissão. Ele então confessa a um padre todos os pecados sensuais que pratica. Abandona definitivamente a convocação de ser padre e passa a se interessar por ideias artísticas e estéticas. Dedalus abandona a carreira de padre mas não a fé.
Assim, Artur Gomes se obstina pela ideia de confissão, mas de uma confissão dionisíaca. Primeiro, fazendo suas Juras Secretas, suas confidências sensuais, sexuais, eróticas, fulinaímicas. Em suma, suas sagaranagens (há algo de Joyce em Guimarães Rosa, ou vice-versa; no Rosa que há em Artur Gomes, no sagarana dos três). Agora, em O poeta enquanto coisa, arriscando-se a abandonar todo credo político-religioso paralisante, move-se – avesso ao dogmático – no sentido de dançar o mitopoético, o dionisíaco. Daí, uma Igreja Universal do Reino Zeus faça todo sentido na cosmogonia e teogonia de Artur Gomes. Em primeiro lugar, como deboche diante de quaisquer fundamentalismos. Em segundo lugar, como denúncia do que um Reino de Deus pode roubar do político o vigor do poético, preferindo um louvor a Dionísio a um Deus que não sabe dançar, que não sabe gozar, na liturgia de uma poesia que roga
por um
poema
que desconcerte
entorte
desconforte
arrombe a porta
dos céus
da tua boca
arranhe os dentes
da loba
arrebanhe os cordeiros
no pasto
e lhes ensine
a subverter
as ordens do pastor
assumo o risco
não sou demo
nem corisco
eu sou cantor
Iansã
é quem me lava
Oxossi é quem me leva
Ogum é quem me manda
Oxum é quem me guarda
eu sou o que
invoca
o que provoca
e incorpora
desconcentra
desconforta
desconstrói
e desconcerta
eu sou o que
interpreta representa
o que inventa
e desafora
o Anjo
Torto
graças a Zeus
a pedra e ao Machado de Xangô
a Capitã do
Mato Caipora
me xinga de poeta enganador
mal sabe ela
que eu sou da
reza
que o homem que se preza
nunca se
escraviza
com chicote de feitor
*Igor Fagundes é poeta, ensaísta,
doutor em Poética e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Autor,
dentre outros, de pensamento dança (2018)
e Poética na incorporação (2016).
Macumbança (2020)
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O POETA ENQUANTO COISA: “NO COURO CRU DA CARNE VIVA” – LINGUAGEM CORPO
por Deneval Siqueira de Azevedo Filho
Ao ler O Poeta
Enquanto Coisa, de Artur Gomes, já na apresentação do poeta, 64,
suas palavras sugerem que o poeta é sujeito e objeto. Perguntei-me: “Mas como
será isso? Sujeito e Objeto?” Sim! Só um punho lírico muito forte, porém
despojado, - “no couro cru da carne viva”. (64) pode com “esporas” ”sangrar
corpos” e “abrir cadafalsos”.
Trata-se de uma poemática em que a linguagem é o corpo. A
expressão que se depreende é o estrondo acompanhado do gozo, la petite mort.
Entretanto a Musa eterna dos estados de surtos e de sítio e estados de surtos e
de sítio e de cio do sujeito (quem sabe do poeta ele mesmo?) nos diz em alto
tom: é a Terra/Mãe/Terra. Por este viés confesso do poeta, entendo que o salto
lírico desta poética ou destes versos “de surtos, de sítio e de cio” é, por excelência,
telúrico.
Assim como a vida é telúrica, o amanhã também o é, assim como
o são os lugares geográficos presentes em muitos versos e que ilustram a
teleologia dos poemas por toda a obra.
Explico: há em toda O Poeta enquanto Coisa, obra
de fôlego e tanto, uma doutrina arturiana que identifica a presença de uma
metalírica em riste, com fins e objetivos metalinguísticos ou ainda criando
situações que deslocam a natureza e a humanidade, considerando a finalidade
como o princípio explicativo fundamental na organização e nas transformações de
todos os seres da realidade, uma espécie de finalismo.
Estes poemas são inerentes a um possível aristotelismo de hoje
e seus desdobramentos, pois se fundamentam na ideia de que tanto os múltiplos
seres existentes, quanto o universo como um todo direcionam-se, em última
instância, a uma finalidade que, por transcender a realidade material, é
inalcançável de maneira plena ou permanente.
Hegel também tratou disso em seus epígonos, segundo os quais o
processo histórico da humanidade assim como o movimento de cada realidade
particular, são explicáveis como um trajeto em direção a uma finalidade que, em
última instância, tem como objetivo uma realização plena e exequível do
espírito humano: em Gomes, inquieto, rebelde, sagaz, verbal, metafórico,
carnal, cuja realização dá-se no sobressalto, no grito, na dicção da audácia,
tanto na poíesis quanto na techné. Sujeito e Objeto reencontram-se no ritmo da
techné: “eu acho que é tempo ainda”. Aí se igualam Sujeito e Objeto.
Oswald de Andrade experimentou um tanto disso na sua Poesia
Pau-Brasil do 1º. Modernismo. Mário de Andrade em Paulicéia Desvairada. Com
outro fluxo nos poemas, obviamente. Artur Gomes reverbera alguns momentos do
nosso 1º. Modernismo, sem dúvida, trazendo-o ao picadeiro contemporâneo:
Cocada agora
só se for de coco
paçoca de amendoim
cigarro só se for de palha
cacique só se for da
mata
linguagem só tupiniquim
bala só se for de prata
água só se for
aguardente
tônica só se for com
gim
estado só se for de surto
eleição só se for sem furto
brilho só no camarim
A existência de uma minemósine (grego Mνημοσύνη), titânide,
filha de Urano e Gaia, deusa que personificava a memória está em
nas pipas nos arcos
nas madrugadas dos bares
descritas num
guardanapo
no copo de vinho
na boca de Vênus
na bola da vez da
sinuca
sangrada pelo meu taco
pois,
aqui a poesia pulsa
nos cabelos brancos da
barba
na divina língua de
Baco.
Reiteram-se, assim, os motivos (leit motiv): em Poética 31, “delírio pouco é bobagem”/ “assim como fantasia”/ “é louca SagaraNAgem”/”no carnaval Real da Orgia””/”Dentro da Noite Veloz”/ “ou na Vertigem do Dia”/ “a luz do sol sobre nós”/”onde marés maresia? O corpo – a própria linguagem”/ no mar da antropofagia”.
O delírio teatral, a física quântica leve, o simulacro pós-moderno, o deboche e a pilhéria percorrem, só para ilustrar a recorrência dos recursos, Poética 33 – Em/Cena Um possível encontro de Clarice Lispector e Federico Baudelaire. O diálogo com Oswald de Andrade retorna em Poética 34. Carregada de muito humor. Grande arma!
Em Poética 38, encontram-se o erótico e o satírico, grande
sacação (Ah, os sátiros!), diga-se de passagem, um encontro inusitado, de verve
crítica e geografia erótica, uma sugestão para um Kama Sutra tupiniquim, por
que não. Grande momento do livro!
Enquanto escavo a seiva
Entre o vão das suas coxas
Para desfrutar teu cio
E santificar teu ócio
A selva amazônica perde
Mais 200 mil hectares de mata
Virgem
Para as moto-serras assassinas Desse venal agro-negócio.
Sendo um flâneur do século XXI, Artur Gomes, caminha,
antes de tudo, como um detetive, no sentido que lhe deu Walter Benjamin:
detecta um fato, poetiza-o e, às vezes, deforma-o. De que forma?
Investigando-o, pilhando-o, desmascarando suas circunstâncias. Venalmente.
Dr. Deneval Siqueira de Azevedo Filho Teoria e História
Literária (Unicamp/Ufes) Letras, Artes e Culturas (Fairfield University, CT,
USA)
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Texto em homenagem ao Poeta Artur Gomes – Na 11ª Mesa-redonda
Poesia Visual Contemporânea, no CCJF Cinelândia – Rio de Janeiro
por
Paulo Sabino
Ao fim de Memória de Fogo, peça teatral em temporada neste
Centro Cultural até domingo passado, SadyBianchin, ator, diretor, roteirista e
um dos responsáveis pelo texto do espetáculo, depois de fazer vários
agradecimentos, fez um que, segundo ele, era o mais importante de ser feito: o
agradecimento a plateia. Isso, porque, para SadyBianchin, à realização de um
espetáculo teatral, podem faltar luz, a trilha sonora, o figurino, a maquiagem,
o cenário; podem faltar todos esses itens. Porém, duas coisas são imprescindíveis
para que a magia do teatro aconteça, para que o espetáculo possa realizar-se o
ator e o público. Sem ator e público, a apresentação torna-se inviável. É dessa
troca, entre ator e plateia, que uma apresentação teatral torna-se possível.
Saí da sala, após o espetáculo, com essa sábia perspectiva
levantada pelo Sady e, naturalmente, eu transpus, para a minha vivência com a poesia: eu, Paulo
Sabino, que adoro realizar saraus, encontro poéticos, a interação entre poetas
e seus leitores, sei o quão importante é, para um poeta com esses mesmos
interesses, ter em suja plateia, aqueles que comunguem da sua paixão maior. E
hoje o Centro Cultural da Justiça Federal, a convite do curador deste evento, o
querido Tchello d´Barros, eu tenho o prazer a alegria de prestar essa homenagem
a um poeta cujos nome e sobrenome podemos perfeitamente trocar por “palco”, “ribalta”, “proscênio”, “sarau”,
“encontro literário”, oficina de arte cênica”, “festival literário”, porque seu
movimentos em prol da poesia está em perfeita sintonia com os espaços onde se
dá, onde acontece, a magia da poesia falada: este poeta é o grande e super
querido ARTUR GOMES.
Falar de ARTUR GOMES é falar de um dos maiores responsáveis
pela manutenção e preservação de espaços onde desfrutamos da troca que é
imprescindível às artes cênicas troca
entre poeta e plateia. Falar de ARTUR GOMES é falar de um dos poetas mais
atuantes na manutenção e preservação de
locais onde a poesia falada, a poesia oral, a poesia trocada pelo verbo, é a
grande estrela. E nesse seu esforço de manutenção e preservação desses espaços,
ARTUR GOMES é dos poetas que mais roda o Brasil, participando de inúmeros
saraus, festivais, encontros e festas literárias, ao longo de sua extensa
carreira artística, mas de 40 anos dedicados à palavra – a grande musa e amante
de qualquer poeta.
Nestes 45 anos de carreira, contabilizados a partir do ano de
lançamento do seu primeiro livro de poesia, Um Instante No Meu Cérebro, 1973,
ARTUR GOMES, no seu amor pela palavra, e de modo abrangente, no seu amor pelas
artes, desenvolveu uma série de outras frentes de trabalho: além de sua atuação
como poeta, ARTUR GOMES é um artista multifacetado, um artista antenado a
diversas linguagens artísticas, como o teatro, a fotografia, o audiovisual e a
performance.
Para que todos os presentes tenham ciência do que digo, de
1985 a 2002, o poeta dirigiu a “Oficina de Artes Cênicas”, do CEFET-Campos,
hoje, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense. De 2011 a
2012, coordenou oficinas de produção audiovisual, na mesma instituição de
ensino. Em 1999 criou o FestCampos de Poesia Falada, que até hoje é realizado
pela Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, em Campos dos Goytacazes. De
2014 a 2016, esteve à frente das oficinas de teatro no “Sesc Campos”. Em 2017
dirigiu o curso de teatro multi-linguagens, no SINASEFE (Sindicato Nacional dos
Servidores Federais de Educação Tecnológica), núcleo do Instituto Federal
Fluminense. Atualmente, ARTUR GOMES é professor de interpretação, do Curso
Livre de Teatro, da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, em Campos dos Goitacazes,
no estado do Rio, e apresenta a performance “Poesia Viva Poesia” que já conta
com mais de uma centena de apresentações. Mês passado ele participou do 1º
Festival de Brasília da Poesia Brasileira, e este mês, hoje, está aqui
participando da 11ª Mesa-redonda sobre Poesia Visual Contemporânea.
E a presença de um poeta multifacetado, como é ARTUR GOMES,
nesta noite, não é mera coincidência. Quando pensamos ou falamos em poesia
visual, não podemos jamais, desvincular esse tipo poético do nome ARTUR GOMES.
Desde o início dos anos 80, ARTUR GOMES é uma voz que dá voz-espaço à poesia
visual. Em 1983, criou o projeto “Mostra Visual de Poesia Brasileira”, com o
objetivo de reunir, num mesmo espaço físico, todas as linguagens poéticas
contemporâneas. Em 1993, na sua décima edição, em parceria com o “Grupo Livre
Espaço de Poesia”, a MVPB (Mostra Visual de Poesia Brasileira) foi realizada
pele rede SESC-SP, em homenagem ao centenário de Mário de Andrade, que culminou com o prêmio de “Evento do Ano”,
concedido pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte), ao Grupo Livre
Espaço de Poesia.
Por muito, portanto, a homenagem prestada ao poeta precursor
da poesia visual é mais do que justa. Encerrando a minha participação saúdo a
poética de ARTUR GOMES lendo um poema do livro que o poeta lança neste evento,
o Juras Secretas, e autografa assim que eu me calar.
*
meta metáfora no poema meta
como alcançá-la plena
no impulso onde universo pulsa
no poema onde estico plumo
onde o nervo da palavra cresce
onde a linha que separa a pele
é o tecido que o teu corpo veste
como alcançá-la pluma
nessa teia que aranha tece
entre um beijo outro no mamilo
onde aquilo que a pele em plumo
rompe a linha do sentido e cresce
onde o nervo da palavra sobe
o tecido do teu corpo desce
onde a teia que o alcançar descobre
no sentido que o poema é prece
Artur Gomes
Juras Secretas
Editora Penalux - 2018
em dezembro lançamento segunda edição ampliada
aguardem mais informações
https://www.youtube.com/watch?v=wIlxWXBaRW8&t=7s
A poesia pulsa
para Tanussi Cardoso
aqui
a poesia pulsa
na veia
no vinho
no peito
no pulso
na pele
nos nervos
nos músculos
nos ossos
posso falar o que sinto
posso sentir o que posso
aqui
a poesia pulsa
nas coisas
nos códigos
nos signos
os significantes
os significados
aqui
a poesia pulsa
na pele da minha blusa
na íris dos olhos da minha musa
toda vez que ela me usa
nas iguarias de Bento
quando trampo mais não troco
quando troco mas não trapo
nas pipas
nos vinhedos nos arcos
nas madrugadas dos bares
sampleando bolero in blues
rasgado num guardanapo
o poema pra Juliana
escrito na cama do quarto
no copo de vinho
na boca de Vênus
na bola da vez da sinuca
sangrada pelo meu taco
aqui
a poesia pulsa
nos cabelos brancos da barba
nas gargalhadas de Bacca
na divina língua de Baco
Manual para desaparecer
Fui quedando em mim mesma
feito poça no quintal de casa vazia.
A solidão, essa comadre bêbada,
chegou sem bater,
com hálito de absinto e olhos de marisco morto,
instalou-se entre as frestas do meu corpo,
fez ninho na arcada dos meus silêncios.
Sou mulher com boca cheia de palavras não ditas,
meus gritos são fósseis em salitre,
versos roídos por ratos eruditos.
Ando com as entranhas à mostra,
em carne viva e vírgula torta,
fazendo do peito um relicário de ferrugens.
Minha cama é um campo minado de memórias,
lençóis que rangem como dentes trincando gelo,
e os travesseiros?
Albergam fantasmas com mania de poeta,
recitam meus fracassos como se fossem
canções de ninar.
Há noites em que a lâmpada me interroga.
Respondo com monólogos insanos,
palavras que mastigo com dentes moles,
ruminando desamores como quem
mastiga cinzas à procura de ouro.
Desaprendi o cheiro da pele alheia,
sou ruína com batom,
sou igreja profanada,
sou a mulher que dança com os ossos do que não foi,
em salões escuros de si mesma.
Meu espelho já não me devolve —
ele cospe.
Cuspe amargo, com gosto de ausência e ferrão,
como se dissesse: “vai, dá um tempo de ti,
antes que até o vazio peça pra sair.”
Tenho sede de um toque que não venha com promessas,
só com o calor exato da carne contra o medo.
Mas tudo o que encosto
vira pedra,
vira prece,
vira piada.
Ninguém me lê com olhos limpos.
Sou rabisco em caderno de bêbado,
sou carta nunca enviada,
sou corpo desabitado por dentro,
mas com as paredes ainda quentes —
como se alguém tivesse partido só há segundos.
A solidão não é ausência —
é excesso.
Excesso de mim,
dos ecos que me estupram a sanidade,
dos relógios que me devoram com mastigação lenta,
excesso de lembranças que me colonizam
como um império podre.
Se me perguntarem quem sou,
direi: sou um erro de sintaxe no poema da criação,
sou vírgula onde deveria haver um ponto-final.
E ainda assim,
respiro.
Feito planta em sala sem janelas,
teimando em ver sol
onde só há pó.
Simone Bacelar
Balbúrdia PoÉtica
Poesia Ali Na Mesa
Edição Especial
À Memória de Renato Aquino
Performance Teatro.Poesia
Roda de Conversa – lançamento do livro Itabapoana Pedra Pássaro Poema
Dia 13 de maio – 21h
Auditório Reginaldo Rangel
IFF Instituto Federal Fluminense
Campus Centro – Rua Dr. Siqueira, 273 – Campos dos Goytacazes-RJ
tempo de poesia
para Renata Magliano
lancei o tempo
na agulha de uma fresta
ainda bêbado de ontem
bebo as 35 pausas
de uma mulher em chamas
que ainda não conheço
o tempo me dirá o endereço
como metáfora ou alquimia
e sendo drama ou festa
tempo de poesia
é o que nos resta
Artur Gomes
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